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segunda-feira, 20 de março de 2017

Crise trava debate sobre foro privilegiado no Congresso




DISPOSITIVO SOB CONTROVÉRSIAS


Instituído para proteger o exercício de funções ou mandatos, o foro, para alguns, hoje, tem motivado impunidade

por William Santos - Editor assistente

A Câmara dos Deputados, segundo Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Casa, deve esperar uma decisão do STF para debater a prerrogativa de foro ( Agência Brasil )

Está na Carta Magna como uma necessidade. Afinal, foi com o intuito de proteger o exercício de determinadas funções ou mandatos que, na Constituição vigente, de 1988, foi instituído o chamado foro privilegiado por prerrogativa de função. Com o dispositivo, visa-se resguardar isenção a julgamentos e evitar instabilidades no País, mas, em meio a cenário de desconfiança social à classe política, o papel do mecanismo tem sido alvo de controvérsias, sob argumentos de que teria efeito contrário ao motivar impunidade. Vozes de diversas instituições têm feito declarações públicas a favor ou contra mudanças e até mesmo a extinção do foro privilegiado, mas a discussão não parece ter espaço no Congresso Nacional. Pelo menos não agora.

Atualmente, tramitam na Câmara dos Deputados, em Brasília, ao menos 14 Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que preveem limitações às hipóteses ou mesmo o fim do foro privilegiado. Outras três, de acordo com dados do site da Casa, já foram arquivadas e uma foi devolvida ao autor. No Senado, há outras quatro matérias com objetivos semelhantes - uma, inclusive, pronta para ir à votação no plenário. Trata-se da PEC 10/2013, de autoria do senador Álvaro Dias (PV-PR) e outros, que altera a Constituição Federal para extinguir o foro especial por prerrogativa de função em casos de crimes comuns.

Calendário especial

A proposta, aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no dia 30 de novembro do ano passado, mantém o dispositivo apenas em caso de crimes de responsabilidade, aqueles cometidos em decorrência do exercício do cargo público. Relator da matéria, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) tem coletado assinaturas de colegas para que seja votada, no plenário do Senado, com calendário especial. Na última semana, ele informou que já reuniu assinaturas suficientes para o requerimento, que pode assegurar tramitação mais célere para a análise da proposta. Randolfe ainda aguarda novas adesões e deve apresentar o pedido nesta semana.

A PEC 10/2013 estabelece que todas as autoridades políticas responderão na Justiça Federal de primeira instância os processos por crime comum. À Agência Senado, o relator disse, portanto, que não procede a crítica de que os políticos ficarão vulneráveis à perseguição por parte dos juízes estaduais. Para impedir que isso aconteça, explica Randolfe, a PEC prevê que os políticos sejam julgados por juízes federais, como Sérgio Moro, que conduz os processos referentes à Operação Lava-Jato. Consulta pública acerca da proposta no site do Senado contabilizava, até ontem (19), 56.044 votos favoráveis e 185 contrários.



Sem previsão

Presidente do Senado, o cearense Eunício Oliveira (PMDB), contudo, sustenta que qualquer proposta que altere o foro privilegiado ainda deve passar por profunda discussão na Casa e não tem previsão de deliberação. "É uma matéria que mexe com a Constituição brasileira, ela é extremamente delicada. Não pode ser uma matéria colocada (em pauta) de manhã e votada à tarde. Tem que ter muito debate. PEC tem que haver debate no plenário, ela passa em dois turnos, com prazos de cinco sessões, depois vai para a Câmara dos Deputados, e lá tem outro procedimento, diferente do Senado", justifica o senador.

O peemedebista ressalta ainda que, no comando do Senado, não quer pautar matérias individualmente, mas em conjunto com o colégio de líderes. "O colégio de líderes tem decidido que matéria entra ou não na pauta na semana seguinte. Essa matéria, nesse momento, não se encontra na pauta", declara. Ele também reconhece que a matéria é "polêmica", mas não deixa explícita qualquer opinião sobre modificações ao dispositivo constitucional. "O presidente do Senado, o presidente do Congresso tem opiniões, mas não expressa essas opiniões, porque senão vai influenciar o colegiado que tem obrigação de conduzir com isenção quando os debates acontecem", desconversa.

Eunício é apenas uma das cerca de 22 mil autoridades que, segundo estimativa do procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal na Operação Lava-Jato, têm hoje foro privilegiado no Brasil. Levantamento publicado pela revista Época na edição do dia 27 de fevereiro, por sua vez, contabiliza cerca de 37 mil detentores de foro privilegiado no País. O mecanismo garante que os processos que envolvem determinadas autoridades devem ser analisados apenas por órgãos superiores, caso, por exemplo, do Supremo Tribunal Federal, do Senado ou das Câmaras Legislativas.

Dentre as autoridades resguardadas pelo direito estão o presidente da República, ministros civis e militares, senadores, deputados, prefeitos, membros do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Ministério Público.

Câmara

Na Câmara, a situação não é tão diferente do Senado. O deputado federal cearense Genecias Noronha (SD) observa que a Casa, hoje, é dividida sobre a possibilidade de mudanças no foro privilegiado. "Nem todo mundo concorda, aí vai para discussão, e nisso tudo cada um tem uma opinião. É como na reforma política. Aqueles que, porventura, estejam respondendo a algum processo no Supremo não querem que mude (o foro), então é uma disputa", avalia.

O parlamentar, porém, defende que a prerrogativa do foro deve valer apenas para atos praticados durante o exercício do mandato. "Eu ter cometido um desvio há oito anos, dez anos, me tornei deputado agora e passo a ter prerrogativa de foro (sobre processos anteriores ao mandato), isso não pode. Eu acho que isso deve mudar", frisa.

Questionado se a discussão sobre restrições ao foro privilegiado não avança na Câmara porque representaria instabilidade a parlamentares que estão na mira da Operação Lava-Jato, Genecias Noronha opina que este não é o momento para deliberar o assunto porque a opinião pública "confundiria Lava-Jato com prerrogativa de foro".

"Passado esse momento, que vai passar, vamos discutir a prerrogativa do foro, vamos discutir o teto salarial do Judiciário, a transparência, tudo nós vamos discutir. Aí sim é o momento para colocar todas essas opiniões que defendem o Judiciário e o Congresso", prega.

Raimundo Gomes de Matos (PSDB), por sua vez, diz que "o grande problema" de lançar luz a tal debate na atual conjuntura é que pode, justamente, haver interpretação relacionada diretamente à Lava-Jato. "Como existe toda essa expectativa de aumentar o número de senadores que são citados na questão da corrupção, como existe a perspectiva de que vários parlamentares serão citados, qualquer articulação para aprimorar essa matéria, não resta dúvida que muitos vão interpretar que é para se blindarem", analisa.

Para ele, é necessária uma discussão "menos corporativista" acerca da pauta, que culmine em uma decisão que vá ao alcance dos anseios da população. "Cidadão que assume cargo público tem muito mais responsabilidade pelos seus atos e não deve ficar amparado por uma cortina que, muitas vezes, não gera transparência em relação aos seus procedimentos", considera Gomes de Matos.

Judiciário

Ele afirma, porém, que o debate deve mirar uma ampla atualização da legislação. "O que estamos vivendo hoje são fatores decorrentes do momento que passa o País, em que se busca fortalecer ou enfraquecer essa ação em virtude da circunstância pontual, sem se fazer um amplo debate da necessidade de adequação para que se tenha mais transparência e fortaleça o processo democrático", acrescenta.

Apesar de ser do Congresso a competência de legislar sobre o dispositivo, o Judiciário também tem participado do debate, acirrado inclusive por divergências entre os próprios ministros do Supremo Tribunal Federal. Na último mês, por exemplo, o ministro Luís Roberto Barroso defendeu uma interpretação mais restritiva do alcance do foro privilegiado que, para ele, é hoje uma "causa frequente de impunidade" e se tornou uma "perversão da Justiça".

Luís Roberto Barroso enviou ao plenário da Suprema Corte, em 16 de fevereiro, uma ação penal na qual deve ser discutida a restrição do mecanismo para deputados e senadores. Para ser julgado, o processo precisa ser pautado pela presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia. Ainda não há data prevista.

Ilusão

O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, disse que a discussão sobre o foro privilegiado está cercada de "assanhamento juvenil" e "venda pública de ilusão". "Há muito assanhamento até juvenil, aproveitando-se da ingenuidade da opinião pública. Agora se descobriu que o grande mal do Brasil é o foro. É populismo jurisdicional", declarou. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou, no dia 21 de fevereiro, que a Casa deve esperar uma decisão do STF para debater a prerrogativa de foro. Ele lembrou, ainda, que o fim do foro privilegiado já foi discutido no Congresso no passado, mas foi derrotado.

Sobre a discussão que ultrapassa o Legislativo, Raimundo Gomes de Matos afirma que disputa entre poderes enfraquece todas as instituições, mas defende que todos devem participar do debate. "No momento em que o Judiciário não participa, não expõe as suas razões, ele pode futuramente julgar que não participou do processo de debate", pondera o parlamentar. Genecias Noronha, por outro lado, considera que seria "casuísmo" de membros de Poder Judiciário aproveitarem do atual momento da opinião pública em favor da Lava-Jato para "confundir a opinião pública".

Fique por dentro*

Alterações estão prontas para votação

Pronta para ser votada em plenário, a PEC 10/2013 prevê o fim do foro privilegiado para todas as autoridades brasileiras, inclusive o presidente da República, nas infrações penais comuns, assim como permite a prisão de membros do Congresso Nacional condenados em segundo grau nas infrações comuns. Hoje, eles são julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e só podem ser presos após condenação definitiva da Corte.

A proposta também elimina a possibilidade de a Casa parlamentar sustar o andamento de ação penal contra os legisladores, hoje prevista pela Constituição. Além disso, a PEC 10/2013 mantém a exigência de autorização da Câmara dos Deputados, por dois terços de seus membros, para o julgamento do presidente da República. O julgamento por crime de responsabilidade continua a ser feito pelo Senado Federal.

*Fonte: Agência Senado

Tempo

"(Extinção do foro) Não pode ser uma matéria colocada (em pauta) de manhã e votada à tarde. Tem que ter muito debate"

Eunício Oliveira (PMDB)
Presidente do Senado

Disputa

"Nem todo mundo concorda, aí vai para discussão, e nisso tudo cada um tem uma opinião. É como na reforma política"

Genecias Noronha (SD)
Deputado Federal

Interpretação

"Qualquer articulação para aprimorar essa matéria, não resta dúvida de que muitos vão interpretar que é para se blindarem"

Raimundo Gomes de Matos (PSDB)
Deputado Federal

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