Léo Pinheiro diz que Lula pediu para ele destruir provas de propina
MARIO CESAR CARVALHO
DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
20/04/2017 18h29 - atualizado às 20h19
Ed Ferreira - 26.mai.15/Folhapress | ||
José Aldemário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, em depoimento à CPI da Petrobras em 2015 |
O empresário Léo Pinheiro, sócio da OAS, disse em audiência em Curitiba que o ex-presidente Lula pediu para ele destruir provas sobre propinas que a empreiteira pagou ao PT.
Segundo Pinheiro, Lula e ele discutiram sobre propina no Instituto Lula, entre abril e maio de 2014, dois meses depois que a Operação Lava Jato ter sido iniciada. Lula parecia "um pouco irritado" e teria perguntado se a OAS pagava propina ao PT no Brasil ou no exterior, segundo o relato feito pelo empreiteiro.
O empresário disse que respondeu que pagava no Brasil. O ex-presidente arguiu se ele mantinha os registros dos pagamentos feitos ao tesoureiro do PT à época, João Vaccari Neto. O empresário disse que mantinha.
Lula teria dito, segundo Pinheiro: "Você tem algum registro de algum encontro de contas, de alguma coisa feita com João Vaccari? Se tiver, destrua".
"Ele me disse 'olha, se você costuma ficar anotando documento, é melhor que você não participe de nada'. Ele foi muito duro na conversa comigo. Não sei lhe responder infelizmente por que ele estava tão irritado", disse o empreiteiro.
A pergunta sobre a discussão de propina com Lula foi feita pelo advogado do petista, Cristiano Zanin Martins. Após a resposta de Léo Pinheiro, Martins ficou quieto.
O empresário não esclareceu na audiência se ele seguiu o pedido de Lula ou não.
TRÍPLEX
Pinheiro prestou depoimento nesta quinta (20) ao juiz Sergio Moro dentro do processo que envolve a reforma de um tríplex em Guarujá (SP). O empreiteiro afirmou que o apartamento pertencia ao ex-presidente Lula.
No ano passado, Pinheiro e o ex-presidente se tornaram réus neste caso. O Ministério Público afirma que Lula recebeu R$ 3,7 milhões em propinas pagas pela OAS oriundas de contratos da Petrobras. Segundo a acusação, o dinheiro foi investido na reforma do tríplex. A OAS também pagou pelo transporte e armazenamento de bens do petista.
Segundo Léo Pinheiro, foi o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto que o procurou para participar do empreendimento onde foi construído o tríplex, o Condomínio Solaris, que era anteriormente de propriedade da cooperativa Bancoop.
"Eu fiz uma ressalva que a empresa só atuaria em grandes capitais", disse Pinheiro. "Ele me disse: 'Olhe, aqui tem algo diferente. Existe um empreendimento que pertence à família do presidente Lula. Diante do seu relacionamento com o presidente, o relacionamento da empresa, nós estamos lhe convidando para participar disso". Pinheiro disse que procurou Paulo Okamotto, atual presidente do Instituto Lula, que confirmou a informação.
No depoimento, advogado de Lula perguntou a Pinheiro: "O senhor entende que o senhor deu a propriedade desse apartamento para o ex-presidente Lula?".
O ex-presidente da OAS respondeu: "O apartamento era do presidente Lula desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da Bancoop, já foi me dito que era do presidente Lula e sua família, que eu não comercializasse e tratasse aquilo como uma coisa de propriedade do presidente".
De acordo com Pinheiro, em janeiro de 2014, o presidente teria solicitado uma visita ao apartamento para definir que reformas deveriam ser realizadas. Teria sido nessa visita acertada a construção de um novo quarto no apartamento, a pedido de Marisa Letícia, e reformas na cobertura do tríplex para dar "mais privacidade à família".
"Na última visita ao apartamento, eu estive com a dona Marisa e o filho do presidente, o Fábio, em agosto de 2014. Uma solicitação dela é que a família queria passar as festas de fim de ano no apartamento, então nós nos comprometemos a entregar tudo antes das festas de fim de ano. Eu fui preso em novembro, então não sei como acabou isso", disse Pinheiro.
O empreiteiro também confirmou que um contrato de armazenamento entre a OAS e a transportadora Granero serviu, na verdade, para guardar bens do ex-presidente Lula a pedido de Okamotto.
DESPESAS
Léo Pinheiro disse que usou dinheiro que seria desembolsado como propina para custear a reforma do apartamento e que Lula sabia disso.
Perguntado por Zanin se "usou valores provenientes da Petrobras para fazer alguma reforma desse imóvel", ele respondeu: "Não, não, não. Eu usei valores de pagamento de propina para poder fazer um encontro de contas. Em vez de pagar X, eu paguei X menos despesas que entraram no encontro de caixa. Houve apenas o não pagamento do que era devido de propina.
"Vaccari me disse, naquela ocasião, que, como se tratava de despesas pessoais, ele iria consultar o presidente. Voltou para mim e disse: 'Tudo ok, você pode fazer o encontro de contas'. Então, não tem dúvida se ele sabia ou não. Claro que sabia", completou Pinheiro.
Essas contas girariam em torno de R$ 15 milhões, segundo o empreiteiro. Ele afirmou ainda ter avisado os superintendentes da OAS "de que não fizessem pagamentos na conta de propina do PT" para quitar os débitos do partido no acerto de contas.
Pinheiro afirmou que abriu dois centros de custos para lançar despesas com o apartamento em Guarujá e também com a reforma de um sítio em Atibaia (SP), frequentado pela família de Lula. Os nomes dos centros de custos eram Zeca Pagodinho Sítio e Zeca Pagodinho Praia.
"Zeca Pagodinho se refere a um apelido que se tinha do presidente [ex-presidente Lula], de Brahma, né? Zeca Pagodinho fazia propaganda da Brahma", afirmou Pinheiro.
Sergio Moro perguntou: "Sitio aqui é sítio de Atibaia?". Ele respondeu: "É o sítio de Atibaia". "Praia aqui é o apartamento no Guarujá?", interrogou o juiz. "É o apartamento no Guarujá", confirmou Pinheiro.
O ex-presidente da OAS disse que a empresa pagou os projetos de cozinha de ambas as propriedades, conforme conversas com a "dama" e a "madame" —codinomes que ele disse se referirem à ex-primeira dama Marisa Letícia.
Pinheiro afirmou, no depoimento, que houve um encontro no apartamento de Lula, em São Bernardo do Campo, em que foram aprovados os projetos de cozinha. Marisa Letícia e Paulo Gordilho, executivo da OAS, também participaram da reunião.
DELAÇÃO
Condenado a 39 anos de prisão e preso pela segunda vez desde setembro do ano passado, Léo Pinheiro negocia um acordo de delação premiada no qual prometeu entregar irregularidades de Lula, do PT e de ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Durante o depoimento, Pinheiro afirma que a tratativa começou há cerca de 90 dias.
O trâmite da delação de Pinheiro chegou a ser suspenso no ano passado pela Procuradoria-Geral da República após vazamento de informações ligadas a obras na casa do ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), em que não foram identificadas irregularidades.
Após o depoimento desta quinta, os advogados Roberto Telhada e Edward Carvalho deixaram a defesa do empreiteiro. Ele era cliente dos criminalistas desde que foi preso pela primeira vez, em novembro de 2014.
Antes do depoimento, o Ministério Público confirmou que Léo Pinheiro tem negociado delação premiada com os procuradores. A defesa de Pinheiro disse a Moro que essa negociação não foi feita pelos advogados.
OUTRO LADO
O Instituto Lula e os advogados do ex-presidente classificaram a declaração de Léo Pinheiro sobre o pedido para destruir provas de mentirosa. Eles também disseram que a acusação foi combinada por procuradores para que eles aceitem o acordo de delação premiada que o empresário negocia com o órgão.
"A versão fabricada de Pinheiro foi a ponto de criar um diálogo —não presenciado por ninguém— no qual Lula teria dado a fantasiosa e absurda orientação de destruição de provas sobre contribuições de campanha, tema que o próprio depoente reconheceu não ser objeto das conversas que mantinha com o ex-presidente", afirma nota de um dos advogados de Lula, Cristiano Zanin Martins.
"É uma tese esdrúxula que já foi veiculada até em um e-mail falso encaminhado ao Instituto Lula que, a despeito de ter sido apresentada ao juízo, não mereceu nenhuma providência", prossegue a nota.
Martins rebateu também a declaração do empreiteiro de que o tríplex do Guarujá é de Lula. A nota diz: "A afirmação de que o triplex do Guarujá pertenceria a Lula é também incompatível com documentos da empresa, alguns deles assinados por Léo Pinheiro. O que disse o depoente é incompatível com relatórios feitos por diversas empresas de auditoria e com documentos anexados ao processo de recuperação judicial da OAS, que indicam o apartamento como ativo da empresa".
Para o advogado de Lula, o empresário "foi claramente incumbido de criar uma narrativa que sustentasse ser Lula o proprietário do chamado triplex do Guarujá. É a palavra dele contra o depoimento de 73 testemunhas, inclusive funcionários da OAS, negando ser Lula o dono do imóvel".
O Instituto Lula nega que o ex-presidente tenha pedido a Léo Pinheiro para destruir provas de propina ao PT. A entidade diz que a afirmação foi feita por um empresário que negocia um acordo de delação com a exigência de incriminar Lula.
Eis a nota do instituto: "O depoimento de Léo Pinheiro, como a própria imprensa noticiou, foi feita em meio a um processo de negociação de delação premiada, que está sendo negociada com os procuradores desse caso. Também foi exigido dele que incriminasse o ex-presidente, segundo reportagem da Folha. A afirmação é desprovida de provas e faz ilações sobre supostos acontecimentos de três anos atrás que jamais ocorreram. Ela foi feita por alguém que busca benefícios penais".
A Folha procurou o advogado de João Vaccari Neto, Luiz Flávio Borges D´Urso, sem sucesso.
Colaboraram BELA MEGALE, JOSÉ MARQUES, CAROLINA LINHARES, THAIS BILENKY e ANGELA BOLDRINI
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