Há anos de pires na mão, prefeitos do interior do Ceará viram o cenário piorar ainda mais nos últimos dias. A crise na saúde, agravada pela chegada do coronavírus ao Brasil, também se reflete no mercado de trabalho e no desafio de sobrevivência de quem menos tem.
Gestores relataram ao Diário do Nordeste que ainda nada receberam do Governo Federal para enfrentar uma crise que ainda não tem data para acabar. A necessidade parte do que é mais básico, como instrumentos de higiene pessoal e equipamentos hospitalares. Um alento foi o anúncio ontem do Governo do Estado do investimento de R$ 45 milhões que deve ser feito para ampliação da infraestrutura dos hospitais regionais.
A medida, embora importante, não resolve as necessidades diárias das administrações, principalmente nas de menor porte. Prefeito de Ipu, cidade de 42 mil habitantes, Sérgio Rufino conta que todas as medidas que tem tomado, como a compra de equipamentos de proteção individual, e de alimentação para a população mais vulnerável que deixou de trabalhar, sai dos cofres municipais.
Cobrança
A preocupação não é apenas momentânea. Com a paralisação do comércio e da indústria, cai o percentual de arrecadação e também os impostos transferidos em âmbito federal no ano que vem. “Nós necessitamos de uma política de Estado na parte social e do ponto de vista econômico”.
O Governo Federal divulgou, nos últimos dias, ações emergenciais, como a transferência de recursos para Estados e Municípios, além de insumos e equipamentos. Investimentos para aumentar o quadro de beneficiários do Bolsa Família também foram anunciados pelo presidente Jair Bolsonaro. Até agora, no entanto, nada chegou por aqui.
Nilson Diniz, presidente da Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), declara que a principal preocupação dos gestores é a recomposição do aporte do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), além da cobertura do déficit de médicos no interior e do aporte ao programa Bolsa Família.
“O fato é que essa crise tem várias dimensões. A econômica, que tem a questão da ação da prevenção, e a social, que é outro fator que vai pressionar muito os municípios por causa da compra de gêneros de primeira necessidade. Se a crise continuar por muito tempo, as pessoas vão precisar ter o que comer”, afirma.
A secretária de Trabalho e Desenvolvimento Social do Município de Granja, que tem aproximadamente 54 mil habitantes, Conceição Domingues, relata que a Prefeitura tem trabalhado com recursos próprios em todas as instâncias. A compra de quatro mil cestas básicas para a população mais vulnerável é uma das ações implementadas. “Granja é um Município pobre que tem uma grande parcela dependente do Bolsa Família e da Prefeitura”, contextualiza a secretária. A compra de produtos de higiene, como álcool em gel, também tem saído dos cofres municipais.
Repasses
O clima de preocupação dos gestores públicos principalmente no interior tem sido assunto recorrente entre eles. O prefeito de Juazeiro do Norte, Arnon Bezerra, diz que há dificuldade de recursos para custear a alimentação e a aquisição de produtos. “(Preocupa) a possibilidade de caída dos repasses do Estado e do Município. Se não tem arrecadação, não terá repasse, a menos que o Governo Federal faça um aporte”, cobra.
A expectativa é pela chegada dos primeiros repasses nos próximos dias. No Ceará, deve ser iniciada uma ampliação sistêmica do número de leitos no interior para combater o novo coronavírus. O secretário de Saúde do Estado, Dr. Cabeto, informou, ontem, que o Governo pretende investir R$ 45 milhões na ampliação da infraestrutura dos hospitais regionais. O montante seria um repasse direto do Tesouro Nacional para as prefeituras de Itapipoca, Iguatu, Icó, Tauá, Crateús, Itaitinga e Aracati.
“O Estado não vai receber nenhum centavo, vamos repassar integralmente. Mais recentemente, solicitamos ao Ministério da Saúde a habilidade de autorização de UTI e, nos próximos 15 dias, iremos repassar para Itapipoca, Iguatu, Icó, Tauá, Crateús, Itaitinga, Aracati, além da ampliação de 50 leitos nos hospitais regionais”, afirmou.
Caucaia e Maracanaú também receberão ampliação nos leitos. Dr. Cabeto informou que o Governo destinou R$ 18 milhões da União para aquisição de insumos a profissionais de saúde e Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).
De cada R$ 100 anunciados pelo Governo para o enfrentamento da pandemia, porém, R$ 64 ainda não saíram do papel porque o Governo Federal não encaminhou as propostas ou o Congresso ainda não votou os projetos de lei que estão sendo usados para acelerar as ações, incluindo as para ampliar a rede de proteção à população de baixa renda.
Medidas
Levantamento do jornal “O Estado de S. Paulo” mostra que do pacote de R$ 308,9 bilhões, 63,9% (R$ 197,5 bilhões) não passaram do anúncio e não chegaram à ponta. As propostas emperradas abarcam R$ 105,3 bilhões em medidas que nem sequer foram editadas pelo Governo e R$ 92,2 bilhões em ações que não foram enviadas ao Congresso, mas estão sendo incorporadas em projetos que estavam em tramitação.
Até agora, as medidas de maior fôlego efetivamente implementadas ficaram concentradas nas empresas, como a flexibilização das regras trabalhistas, oferta de crédito barato, suspensão do pagamento de tributos, além de auxílio a estados e municípios.
Emendas de bancada
Deputados e senadores do Ceará decidiram remanejar quase todo o orçamento das emendas de bancada para combater o coronavírus no Estado. Dos R$ 215 milhões disponíveis, R$ 181 milhões serão utilizados por prefeitos e pelo Governo do Estado para o custeio da estrutura de saúde no combate ao vírus.
Saúde
O restante do valor, embora não tenha sido destinado exclusivamente para a Covid-19, também ficará com a saúde. Serão R$ 16,4 milhões para custear a saúde média e de alta complexidade e os outros R$ 17,2 milhões serão investidos na atenção básica.
Transferência
A expectativa é que, pelo menos, o valor correspondente ao combate à Covid-19 seja pago já na semana que vem, conforme promessa do Governo Federal. A transferência será feita depois da edição de uma Medida Provisória nos próximos dias.
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